No final do século XIX, a Associação Comercial de Santos já desempenhava papel importante no desenvolvimento da cidade portuária. Além de lutar por melhores condições de trabalho para seus associados, como a redução de taxas alfandegárias e de transporte, e fornecer informações essenciais para o planejamento das exportações, a entidade decidiu ir além de suas atribuições comerciais. Inspirada pelo desejo de promover a cultura e acompanhar o progresso que o café trazia à paisagem urbana, a Associação liderou um projeto visionário: a construção de um teatro que colocasse Santos à altura das grandes capitais do país.
Em uma época em que São Paulo já ostentava o luxuoso Teatro São José, construído em 1864, os santistas almejavam um espaço semelhante para sua elite exigente. Até então, a cidade não possuía uma infraestrutura adequada para receber grandes espetáculos. As apresentações artísticas ocorriam em locais improvisados e desprovidos de conforto, um contraste gritante com o refinamento esperado pela sociedade local.
Determinada a transformar esse cenário, a Associação Comercial formou, em 1876, uma comissão liderada por Antônio José Vianna, Francisco Martins dos Santos e Joaquim Xavier Pinheiro. A missão era clara: arrecadar fundos para a obra. O esforço resultou na subscrição de 512 ações, cada uma avaliada em 200$000, sendo mais da metade adquirida pelo presidente e vice-presidente da Associação. A liderança de Nicolau Vergueiro e do Barão do Embaré foi decisiva, pois convenceram outros membros da entidade a colaborar com força.
Em 21 de dezembro de 1879, a construção do teatro foi formalmente anunciada, recebendo o nome de Teatro Guarany em homenagem à célebre ópera de Carlos Gomes, símbolo do orgulho nacional. Inicialmente planejado para a Quadra Mauá (atual Praça José Bonifácio), o projeto foi transferido para um terreno na Rua das Flores (hoje Amador Bueno), próximo a edificações emblemáticas como a Casa de Câmara e Cadeia e a Igreja São Francisco de Paula.
A pedra fundamental foi lançada em 6 de janeiro de 1881, marcando o início de um empreendimento que uniria progresso e cultura. O projeto arquitetônico, assinado pelo engenheiro Manuel Ferreira Garcia Redondo, seguiu o estilo neoclássico, inspirado em teatros renomados como o São João de Lisboa e o São João do Rio de Janeiro. A escolha refletia o gosto refinado da burguesia brasileira, que buscava espelhar a opulência europeia.
A construção, concluída em quase dois anos, foi um testemunho de excelência. Materiais de altíssima qualidade e técnicas avançadas para a época foram empregados. As esquadrias eram de pinho de Riga, as telhas importadas de Marselha e os detalhes em ferro fundido vinham da prestigiada Casa Hargreaves, na Corte. A carpintaria e marcenaria ficaram a cargo de Thomaz Antônio de Azevedo, dono da única oficina movida a vapor na cidade, famosa por sua precisão artesanal.
Inaugurado em 7 de dezembro de 1882, o Teatro Guarany tornou-se um marco cultural e arquitetônico e produziu muitas histórias.